segunda-feira, 6 de junho de 2011

Real, real, porque me abandonaste?

Fotografia de Lucília Monteiro (2005)

A ferida


Real, real, porque me abandonaste?
E, no entanto, às vezes bem preciso
de entregar nas tuas mãos o meu espírito
e que, por um momento, baste

que seja feita a tua vontade
para tudo de novo ter sentido,
não digo a vida, mas ao menos o vivido,
nomes e coisas, livre arbítrio, causalidade.

Oh, juntar os pedaços de todos os livros
e desimaginar o mundo, descriá-lo,
amarrado ao mastro mais altivo
do passado. Mas onde encontrar um passado?



Manuel António Pina, Poesia, Saudade da Prosa - uma antologia pessoal

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