segunda-feira, 14 de julho de 2014

«Verbo — Deus como interrogação na poesia portuguesa» § Lançamento em Lisboa


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Na próxima quinta-feira, dia 17, pelas 18:30, assista ao lançamento em Lisboa da antologia poética «Verbo — Deus como interrogação na poesia portuguesa». Na Capela do Rato, com a apresentação a cargo de Fernando J.B. Martinho, José Tolentino Mendonça e Pedro Mexia, e leitura de poemas por Luis Miguel Cintra. Contamos com a sua presença!

segunda-feira, 7 de julho de 2014

CARMINA I em Vila Nova de Famalicão

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A Fundação Cupertino de Miranda em parceria com a Câmara Municipal de Vila Nova de Famalicão vai realizar, nos próximos dias 11 e 12 de julho, CARMINA 1, encontro de poesia coordenado por Tolentino Mendonça e Pedro Mexia.

CARMINA pretende reunir um grupo de especialistas em literatura, fazendo deste um evento único no universo da poesia. Nomes como Sousa Dias, Alex Villas Boas, Fernando J. B. Martinho, Maria João Reynaud, Rosa Maria Martelo, Maria João Costa, Frederico Lourenço, Jorge Sousa Braga, Rui Lage e Pedro Sobrado fomentarão conversas com o intuito de nos aproximarem das interrogações de Deus na poesia.

No dia 12 será apresentada a antologia Verbo — Deus como interrogação na poesia portuguesa publicada pela Assírio & Alvim.



“Deus como interrogação, assim se chama a antologia, porque Deus existe, na poesia como na vida, em modo interrogativo, mesmo para quem tem fé. Esta não é uma antologia para crentes ou para não-crentes, é uma antologia de poesia que dá exemplos de um tema, de um motivo, de uma obsessão, exemplos portugueses, numa época que também nos deu Claudel, Eliot, Luzi ou Milosz, poetas com uma questão, com uma pergunta que nunca está respondida.”

Dos poetas antologiados estarão presentes Armando Silva Carvalho, Carlos Poças Falcão e Fernando Echevarría que promoverão uma conversa moderada por Pedro Mexia e Tolentino Mendonça.


sexta-feira, 4 de julho de 2014

Ruy Belo — Era uma Vez



Está prestes a começar o Curtas Vila do Conde 2014 onde estreará o documentário «Ruy Belo, Era uma Vez», produzido pela Zulfilmes com o apoio da Fundação Calouste Gulbenkian. Este domingo, dia 6 de junho, pelas17:00. Apareça!

«Ruy Belo, Era uma Vez» é um documentário sobre a obra e a vida do poeta Ruy Belo. Depoimentos, conversas, leituras e locais que muito contribuíram para a sua vasta produção. De São João da Ribeira, onde nasceu, até Paris, para ouvir Chico Buarque a ler dois poemas, passando ainda por Madrid, onde o poeta foi leitor de português, o filme reúne pessoas que conviveram com Ruy Belo, que com ele viveram intensas amizades e partilharam a paixão pela arte. Também quem o lê, interpreta e estuda nos ajuda a compreender e a ir ao encontro de um dos maiores poetas da segunda metade do século XX. O nosso poeta URGENTE.



GÉNESE E DESENVOLVIMENTO DO POEMA

Vozes vizinhas vindas da infância
através do sotaque de quem fala aqui ao lado
o sol inexorável sobre as águas
pressentimentos vindos com o vento
a velha fortaleza a vista da baía
a maré cheia a tarde as nuvens o azul
memória disto tudo noutro verão noutro lugar
e pelo meu olhar visivelmente vitimado
tudo possível pela mesa e pela esferográfica
pelo papel desculpa ó minha amiga pelo bar
a solidão assegurada pela multidão
a luz a hora as férias o domingo
o cruzeiro de pedra o largo o automóvel
tudo isto não importa importam só 
as mínimas e únicas palavras que me ficam disto tudo
e tudo isto fixam: «tempo suspenso» ou «mar imóvel»
ou «sinto-me bem» ou — que sei eu? — «alguém morreu»


Ruy Belo, in «Todos os Poemas». 4.ª edição, Assírio & Alvim, 2014.



quarta-feira, 2 de julho de 2014

Sophia de Mello Breyner Andresen (06-11-1919 § 02-07-2004)


(fotografia de João Cutileiro)


CAMINHO DA MANHÃ


Vais pela estrada que é de terra amarela e quase sem nenhuma sombra. As cigarras cantarão o silêncio de bronze. À tua direita irá primeiro um muro caiado que desenha a curva da estrada. Depois encontrarás as figueiras transparentes e enroladas; mas os seus ramos não dão nenhuma sombra. E assim irás sempre em frente com a pesada mão do Sol pousada nos teus ombros, mas conduzida por uma luz levíssima e fresca. Até chegares às muralhas antigas da cidade que estão em ruínas. Passa debaixo da porta e vai pelas pequenas ruas estreitas, direitas e brancas, até encontrares em frente do mar uma grande praça quadrada e clara que tem no centro uma estátua. Segue entre as casas e o mar até ao mercado que fica depois de uma alta parede amarela. Aí deves parar e olhar um instante para o largo pois ali o visível se vê até ao fim. E olha bem o branco, o puro branco, o branco da cal onde a luz cai a direito. Também ali entre a cidade e a água não encontrarás nenhuma sombra; abriga-te por isso no sopro corrido e fresco do mar. Entra no mercado e vira à tua direita e ao terceiro homem que encontrares em frente da terceira banca de pedra compra peixes. Os peixes são azuis e brilhantes e escuros com malhas pretas. E o homem há-de pedir-te que vejas como as suas guelras são encarnadas e que vejas bem como o seu azul é profundo e como eles cheiram realmente, realmente a mar. Depois verás peixes pretos e vermelhos e cor-de-rosa e cor de prata. E verás os polvos cor de pedra e as conchas, os búzios e as espadas do mar. E a luz se tornará líquida e o próprio ar salgado e um caranguejo irá correndo sobre uma mesa de pedra. À tua direita então verás uma escada: sobe depressa mas sem tocar no velho cego que desce devagar. E ao cimo da escada está uma mulher de meia idade com rugas finas e leves na cara. E tem ao pescoço uma medalha de ouro com o retrato do filho que morreu. Pede-lhe que te dê um ramo de louro, um ramo de orégãos, um ramo de salsa e um ramo de hortelã. Mais adiante compra figos pretos: mas os figos não são pretos mas azuis e dentro são cor-de-rosa e de todos eles escorre uma lágrima de mel. Depois vai de vendedor em vendedor e enche os teus cestos de frutos, hortaliças, ervas, orvalhos e limões. Depois desce a escada, sai do mercado e caminha para o centro da cidade. Agora aí verás que ao longo das paredes nasceu uma serpente de sombra azul, estreita e comprida. Caminha rente às casas. Num dos teus ombros pousará a mão da sombra, no outro a mão do Sol. Caminha até encontrares uma igreja alta e quadrada.
Lá dentro ficarás ajoelhada na penumbra olhando o branco das paredes e o brilho azul dos azulejos. Aí escutarás o silêncio. Aí se levantará como um canto o teu amor pelas coisas visíveis que é a tua oração em frente do grande Deus invisível.

in «Livro Sexto», brevemente na Assírio & Alvim.